Capítulo 6 - Revelação Específica. Definição de Alguns Termos

Textos bíblicos específicos a serem interpretados:

Dt 24:1-4; Mt 5: 27-32; Mt 19: 3-12; Mc 10: 2-12; Rm 7: 2,3; I Co 7

Repudiar Απολύω.

Formada pela preposição απο mais o verbo λύω traduzido como infringir (Mt 5:19), desatar (Mt 6:19), destruir (Jo 2:19), tirar (At 7:33), despedir (At 13:43), soltar (At 22:30), derrubar (Ef 2:14), desfazer (I Jo 3:8), libertar (Ap 1:5) e abrir (At 27:41).

O uso de Απολύω no NT: aparece 66 vezes com as seguintes traduções: deixar (Mt 1:19), repudiar (Mt 5:31), despedir (Mt 14:15), despachar (Mt 15:23), enviar (Mt 15:32), soltar (Mt 18:27), perdoar (Lc 6:37), deixar ir (At 16:35).

Somente pelo uso da palavra no texto já se nota que repudiar não tem conotação específica tão pejorativa aplicada ao matrimônio. O ato de despedir pode ser bom ou ruim. A Igreja despede um apóstolo e isto é bom. O patrão despede o empregado e isto é ruim para este. Para entendermos melhor os textos sobre o divórcio já poderíamos ler assim: “aquele que despedir sua esposa”... Sendo assim, se a palavra no português tem de ser “repudiar” que já tomou uma conotação especial entre nós, porque então não é traduzido que “José resolveu repudiá-la ( a Maria) secretamente? A palavra é a mesma
Απολύω mas foi traduzida por deixar. A palavra repudiar não lembra muito o fato do marido desgostar-se da esposa ou vice-versa mas de por a esposa para fora de casa, despedindo-a.


Relação sexual ilícita: πορνεία


A tradução deveria ser “prostituição” ou “fornicação”, mas os tradutores ajeitaram um pouco, talvez por causa da polêmica, e escreveram, em algumas versões, relações sexuais ilícitas, nos textos nos quais Jesus fala sobre o divórcio.
Πορνεία origina-se de Πορνεύω ,traduzido normalmente como fornicar, que por sua vez procede de Πόρνη, meretriz ou prostituta, e que se origina ainda de outra palavra, Πορνος, fornicário, dissoluto.


Salientemos como existem diferenças nas traduções. A Bíblia em espanhol, de Cipriano de Valera trás, no texto sobre o divórcio, “fuera de causa de fornicacion” em Mt 5:32. Da mesma forma em Mt 19:9. Cipriano de Valera traduziu “fornicacion” em todas as 25 vezes que aparece Πορνεία no NT. Na tradução de Almeida, revista e atualizada, lemos em Mt 5:32 “relações sexuais ilícitas”, em Mt 15:19 lemos “prostituição” para a mesma palavra. A King James II Version traduz “fornication”. Oswaldo Alves, na Tradução na Linguagem de Hoje, traduz “adultério” neste texto e em Mt 15:19 quando já existe a palavra adultério junto com a de fornicação, então a BLH traduz “outras coisas imorais”. Em Mt 19:9, texto sobre o divórcio, lemos de novo, na Almeida, “relações sexuais ilícitas” . Em Mc 7:21 lemos “prostituição”. Em Jo 8:41 em Cipriano de Valera lemos “ no somos nascidos de fornicacion” e na Almeida lemos: “não somos bastardos” ( na verdade o texto é como o de Valera, no original, porque para nós a palavra bastardo não deixa claro que estão dizendo “filhos de prostituição”.

O texto de At 15:29 é importante para nosso estudo. Os judaizantes queriam colocar carga extra sobre os gentios crentes. É claro que os apóstolos não resolveram falar com eles tudo que deveriam evitar, senão estariam enviando os dez mandamentos, para começar e outros preceitos importantes e que todo crente já sabe precisar cumprir. Por causa dos judeus, o que pedir aos gentios crentes, na época, para equilibrar as coisas. Então resolveram pedir algumas coisas que não eram muito comuns aos gentios: absterem-se das coisas sacrificadas aos ídolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e da prostituição ( Πορνεία ). Porque não escreveram μοιχεία ? Não era a intenção de proibir o adultério, pois isso era já óbvio, mas as relações pre-maritais e outras nem sempre são, até hoje, vistas como pecados, por muitos crentes. A BLH traduziu “não pratiquem imoralidades”, a Almeida, “relações sexuais ilícitas” , a King James, “fornication” e a Valera, “fornicacion”.

Em Gl 5:19, sobre as obras da carne lemos que são μοιχεία, Πορνεία, etc. Em vez da Atualizada traduzir adultério, prostituição ( ou fornicação), traduz: “prostituição, impureza”. Confunde agora adultério com a prostituição. E fala de impureza quando deveria dizer fornicação ou prostituição.

Esta palavra (Πορνεία), portanto, não significa adultério e sim prostituição ou fornicação. Poderá muito bem ser aplicada a relações antes do casamento, isto é, quando um homem casa-se e vê que sua esposa, quando solteira se prostituía. Veja que Jesus em Mt 19:9 diz que se alguém deixar sua esposa não sendo por causa de Πορνεία (não μοιχεία , adultério), comete adultério. Quando José pensou em deixar Maria foi porque tudo estava indicando que ela estava pecando com Πορνεία, prostituição antes do casamento. No entanto eminentes exegetas dizem enfaticamente que, ao contrário de μοιχεία, que significa adultério especificamente, Πορνεία tem um significado mais amplo, isto é, significa prostituição, fornicação e ainda outros tipos de impurezas e até mesmo o adultério pois este não deixa de ser uma fornicação, só que de pessoa casada.


Adulterar, μοιχάομαι


Aparece no NT quatro vezes (Mt 5:32, 19:9; Mc 10:11 e 12) traduzido sempre por adulterar ou cometer adultério. Origina-se de μοιχός (adúltero) que aparece três vezes no NT (Lc 18:11; I Co 6:9 e Hb 13:14). Existe ainda outra forma de palavra originada de μοιχός que é μοιχεύω, adulterar, e aparece quinze vezes no NT e finalmente a palavra μοιχεία, que aparece três vezes traduzida por adultério.

Importante notar que a Palavra de Deus coloca várias vezes a palavra fornicação (πορνεία) junto com adultério (μοιχεία)e com significados e aplicações diferentes: Vejamos os textos onde isto acontece:

Mt 15:19 (e Mr 7:21 da mesma forma): “Porque do coração procedem maus desígnios... adultérios(μοιχεία), prostituição(πορνεία)...

Ainda é bom notar que a mulher pega em adultério era casada, com certeza, e traía seu marido, por isso deveria morrer. Ninguém chegou somente perguntando se estava certo que o marido divorciasse dela. E a palavra neste texto (Jo 8:3) é μοιχεία, adultério mesmo e não prostituição e fornicação (πορνεία), pois assim estaria a mulher, solteira, se prostituindo, o que não foi o caso.



“Cousa indecente” רבד תורע


תורע Primeiro significado : nu, desvestido; em segundo lugar: vazio. Usado no texto que fala que um homem não poderia descobrir a nudez de uma mulher no tempo da “enfermidade dela” (Lv 20: 18). Usado também para “derramar”, como verbo: “derramou sua alma na morte”(Is 53:12). A mesma palavra em outra forma significa “campo seco” ou “desnudo”( Is 19:7).


רבד No texto em estudo significa “alguma coisa”.


“Cousa indecente” tem a ver, portanto, com a questão moral. Algo que envergonhava como ficar nu na frente de estranhos ou coisa parecida. Pelo contexto do AT e da cultura da época dá a entender que sejam impurezas ou qualquer tipo de ação indecorosa.

Segundo Guy Duty, em seu livro “Divórcio e Novo Casamento”, à pg. 20, alguns gramáticos hebreus mostram-se incertos quanto ao significado da palavra “indecente” neste verso. O vocábulo hebraico é רבד תורע (ervah-dover), que tinha diversas interpretações no Talmude judeu, variando de um século para outro e de um país para outro. Não poderia ser o adultério porque o mesmo era motivo de morte.

No entanto chamamos atenção para o termo no hebraico moderno, o construto de תורע que se lê הורע. No dicionário Básico – Hebraico Português, de H. Balgur e H. Lusim, lemos para הורע a seguinte tradução: ” vulva; nudez; fornicação”.

O divórcio era costume dos povos e não foi uma invenção de Moisés ou do povo judeu. O texto de Dt 24:1- 4 sugere que:
a. Não estava Moisés aqui instituindo o divórcio mas considerando a sua existência e a possibilidade de alguém fazer uso do divórcio por causa de achar coisa indecente na mulher : “Se um homem tomar uma mulher e se casar com ela, e se ela não for agradável aos seus olhos, por ter ele achado cousa indecente ( רבד תורע ) nela, e se ele lhe lavrar um termo de divórcio, e lho der na mão e a despedir de casa”.
b. A finalidade principal do texto citado é a de declarar ser considerado abominação perante o Senhor o fato da mulher voltar a se casar com o primeiro marido, novamente. Podemos fazer a seguinte pergunta: abominação porque Deus a considerava antes de todos ou por que era considerado errado na cultura dos povos da época e Deus seria desonrado com tal prática?

c. O divórcio e a poligamia. O JUDEU NAO PODIA DIVORCIAR-SE EM QUASE NENHUM CASO: Isso se levarmos em consideração a interpretação mais radical desde a época de Moisés e que Jesus outorgou como sendo a que mais coadunava com o espirito da Lei. Mas na época era comum a poligamia e era aceita pelas leis civis. Acontecia, portanto que, moral e espiritualmente, a esposa anterior era rejeitada em função da nova que chegava. Muitas vezes isso poderia significar que o marido nem mesmo a procuraria mais no sentido sexual ou seria relegada a segundo plano o que levava a conseqüências bem diferentes das de hoje, senão vejamos:

i. O marido podia resolver seu problema de incompatibilidade ou outro qualquer simplesmente arranjando outra mulher, desde que permanecesse civilmente casado e sustentasse a esposa espiritual e moralmente repudiada.

ii. A esposa repudiada extra-oficialmente tinha a tristeza de sentir e ver-se trocada por outra e tudo "legalmente" e ainda, teria de conviver com o fantasma da tentação para o adultério, um dos motivos de se ter eunucos nos haréns.

iii. O divorcio era difícil de ser consentido, pela lei, mas não divorciar-se, para o homem poderia, portanto, significar apenas continuar a dar a pensão e moradia a esposa.

iv. O homem que tinha problema em seu casamento e podia sustentar outra esposa, o que era possível na maioria dos casos, pois não havia o consumimos de hoje, não enfrentava o problema do abrasamento, estando casado e sem estar com a vida sexual ativa, pois logo casava-se com a segunda esposa, caso não divorciasse.

v. Hoje a realidade é totalmente diferente. Casais que não tem vida normal, sexualmente falando, sabendo que não lhes é permitido o divórcio, ainda que o ideal seja o perdão, a fé e o sacrifício, mas não conseguindo, vivem abrasados e muitos mais sujeitos à tentação sexual.

vi. A mulher hoje não é mais objeto de posse do homem como naquela época e isso trouxe outros parâmetros que aumentam a intolerância da mulher frente a casos em que é tratada indignadamente.
vii. O crente, tanto a esposa quanto o esposo, hoje tem mais dever de buscar o bem para seu matrimonio, pois vivem na dependência da graça de Deus. No entanto, não conseguindo ter tal vida de fé fica-lhes mais difícil manter o casamento que na época do Antigo Testamento.
d. Na época de Jesus os judeus não eram unânimes a respeito do divórcio. O matrimônio para o judeu era um dever sagrado. A mulher para a lei judia era um objeto e carecia de direitos legais e o divórcio acabava sendo uma fatalidade, baseada em Dt 24: 1-4.

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