Capítulo 8 - Um Conceito Difícil de Praticar

Mt 19:11 Nem todos são aptos para receberem este conceito.

Quando Jesus enunciou a condição dos casados os discípulos ficaram intrigados e disseram a Jesus que convinha então nem se casar. Jesus respondeu que nem todos são aptos para receberem este conceito. Aqui temos uma passagem difícil de entender pois Jesus dizia que nem todos estavam aptos para receberem o conceito de que não se pode divorciar por qualquer motivo ou o conceito de que é bom ficar solteiro?

O apóstolo Paulo disse também algo parecido com relação a ficar sem mulher, que dependeria de possuir ou não a dádiva dom. Temos, no final das palavras de Jesus uma expressão que dá força à segunda interpretação, isto é, de receberem o conceito de ficarem solteiros. Trata-se da expressão “Quem é apto para o admitir, o admita”. Vamos ver como ficaria das duas maneiras, mas antes estudemos melhor os termos no original.

Jesus porém lhes respondeu: nem todos são aptos para receber este conceito, mas apenas aqueles a quem é dado. Porque há eunucos de nascença; há outros a quem os homens fizeram tais; e há outros que a si mesmos se fizeram eunucos, por causa do Reino do Céus. Quem é apto para o admitir, o admita.

Apto (1ª vez)= χωρουσιν , pres. de χωρέω, dar mental admissão a, aceitar, compreender, entender; levar, conter; abrir lugar no coração para; descer, vir; ter lugar.

Receber = δέδοται perf. pass. de δίδωμι, dar, oferecer, conceder, etc.

Apto(2ª vez, outro vocábulo)= δυνάμενος pres. part. de δυναμαι: poder, Ter o poder, ser poderoso, forte, capaz. O verbo tem a mesma raiz da palavra poder de At 1:8, “recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo”. Veja a diferença entre “apto” do início do verso e este segundo “apto”. é muito grande a diferença. Creio ser possível fazer a seguinte paráfrase:

“Jesus porém lhes respondeu: nem todas as pessoas estão de coração aberto e admitem receberem para si mesmos tal conceito... quem foi revestido com o poder de Deus para receber esta dádiva (este dom), que receba”.

Poderíamos ainda reler a partir do ponto de vista da responsabilidade humana e da soberania e predestinação de Deus, fazendo uma interpretação, segundo penso, dá a entender a paráfrase:

“Jesus porém lhes respondeu: é responsabilidade de cada um aceitar ou não, ter ou não vontade e buscar compreender ou não o conceito. Nem todos aceitam e portanto nem todos recebem o poder de Deus para viverem neste tipo de vida. Mas se você é vocacionado para receber esta graça de Deus e se Deus a tem derramado sobre você, então tome posse, viva sem medo e na fé”.

A BLH traduz assim, dando a interpretação do autor, pois é tradução dinâmica, que escolhe a interpretação e a dá, quase como numa paráfrase: “Jesus respondeu: Este ensino não é para todos, mas somente para aqueles a quem Deus o tem dado... Quem puder que aceite este ensino”.

Vamos às interpretações sugeridas :

Primeira interpretação:

Discípulos: Se esta é a condição do homem relativamente à sua mulher, não convém casar.
Jesus: Nem todos têm condições de entenderem este conceito de não poder divorciar-se, exceto em caso de fornicação, mas quem é revestido de poder para receber, que receba, isto é, que resolva se casar pela fé, confiando que Deus irá dar o poder de continuar casado.

Segunda interpretação:

Discípulos: Se esta é a condição do homem relativamente à sua mulher, não convém casar.
Jesus: Nem todos têm condições de entenderem este conceito de ser mais aconselhável ficar solteiro, mas quem é revestido de poder para receber, que receba, isto é que resolva, pela fé, nunca se casar.


Assim perdura ainda a pergunta: que ensino é esse que depende da dádiva de Deus para aceitá-lo ou vivê-lo? Trata-se do casado que, pela fé, receberá o dom de ser vitorioso e não chegar nunca ao divórcio ou do solteiro que recebeu o dom de ficar solteiro? Estou inclinado a aceitar que, neste caso, o Espírito Santo está relacionando as duas realidades (casado/solteiro) e aplicando nelas o mesmo princípio do revestimento de poder para vencer, pois é lógico que em todos os dois casos, é necessário poder de Deus para viver como Jesus deseja, pois isto significa viver o Evangelho e não se vive o ideal do Evangelho de forma carnal mas no poder do Espírito Santo de Deus. No entanto fica claro, depois do estudo do texto, que o assunto se refere, em primeira instância ao casamento mesmo. Os discípulos estão admirados sobre o conceito sobre o casamento e o fato de ficar solteiros é apenas um adendo dado por seu espanto. Jesus ao responder logicamente fala sobre o assunto todo, que é casamento, e não sobre um adendo feito, ficar solteiro.

Gardner escreveu em seu livro de Ética: “Se as leis sobre o casamento forem excessivamente rigorosas, estimularão a infidelidade, a falsidade e mesmo a prática deliberada daqueles atos que são reconhecidos como razões a justificar o divórcio. Para atingir-se o ideal cristão do casamento torna-se indispensável a fé cristã vital, não sendo prático nem caridoso forçar os que não possuem aquela fé a aceitar o ideal cristão in toto. Na Verdade, não é prático também, e nem caridoso, tentar impor a indissolubilidade aos próprios cristãos, visto que o que pode ser imposto pela lei não é a união genuína, permanente, monogâmica, mas apenas uma forma externa.”
Concluindo aí ficamos aceitando, portanto, que o ideal do casamento é o exigido pelo Evangelho, ensinado por Jesus como forma perfeita diante de Deus e ainda, forma original, mesmo antes de Moisés. Mas que nem todos irão conseguir porque não estão vivendo o Evangelho em sua plenitude, por não aceitarem o Evangelho ou por estarem sendo carnais, ainda que crentes. Assim sendo o ideal para o casamento, segundo Deus, deixa de ter seu cumprimento em muitos crentes

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